domingo, 13 de abril de 2008

Laura


Laura lê o jornal, enquanto come uma sandes, no recanto de um jardim. Está tão entretida que não se apercebe que alguém um pouco afastado observa os seus movimentos.
Laura chegara à cidade há poucos dias, cheia de esperança de encontrar trabalho rapidamente. Alugara um quarto, e todos os dias percorria a cidade à procura de emprego.
O desânimo apoderara-se dela! As poucas economias haviam desaparecido com o aluguer do quarto e a comida.
Laura olha melancólica para a pessoa que lhe pede autorização para se sentar a seu lado no banco. É uma pessoa atraente e com uma aura de bom, quase santo ! Inevitavelmente, instalou-se um diálogo entre eles ! Ingénua, Laura acaba por contar que anda desesperada à procura de emprego.
Ele apresentou-se como sendo Paulo e disse que na empresa onde trabalhava procuravam funcionárias, o que deixou Laura um pouco mais optimista. Combinaram encontrar-se no dia seguinte no mesmo local.
Laura regressa ao hotel mais contente, pensando que uma dádiva lhe caira do céu. No dia seguinte, foi com o Paulo à entrevista, confiante que com a ajuda dele tudo seria bem mais fácil.
Começaram a distanciar-se da cidade. Laura teve uma sensação estranha : o seu sexto sentido sussurrava-lhe que algo estava errado. Paulo sossegou-a dizendo que a fábrica estava instalada nos arredores da cidade e em breve chegariam ao local. O carro estacionou-se em frente de um edifício velho , rodeado por árvores. Saíram do carro, Paulo sempre sorridente.
Apenas entrou no edifício, foi empurrada brutalmente para dentro dum quarto. Laura gritou, suplicou, bateu na porta mass tudo em vão.Tinha caído numa ratoeira! A raiva e a revolta fizeram berrar bem alto a sua dor!
A vida em poucos segundos tinha desabado. Era prisioneira, refém de uma rede de tráfico de mulheres. Durantes dias só viu a pessoa que lhe levava um pouco de comida e a dose de droga que lhe injectavam. Pela noite fora, entravam os clientes, a quem tinha que se entregar e proporcionar o máximo prazer. Quando acabava, o nojo empurrava-a invariavelmente para a casa de banho, onde vomitava tudo o que podia.
Laura sentia-se um bandalho, revoltada, torturada, mas na mente só tinha uma ideia : libertar-se a todo o custo !
Quando fazia algo que desagradava, era espancada brutalmente . Perspicazes, os seus carrascos tinham sempre o cuidado de não deixar rastos das agressões. Nas suas orações pedia clemência e muitas vezes duvidou da sua fé.
Aquela situação durou alguns meses. Depois começou a sair do quarto e ir até ao clube nocturno, que ficava no mesmo edifício, onde se encontravam outras prostitutas de várias nacionalidades.
Passadas mais algumas semanas, começaram a levá-la para certas zonas da cidade, locais frequentados por prostitutas que eram vigiadas à distância. Enchendo-se de coragem, Laura começou a urdir o plano da sua fuga.
Aos poucos, começou por diminuir o consumo de droga, vendendo discretamente o que não tomava, pois sabia-se espiada.
Bonita e sensual como era, Laura passou a ser enviada para hotéis de luxo, para se inflitrar no mundo dos ricos e extorquir dinheiro a velhos milionários.
Laura fazia tudo com muita perícia e sempre com um sorriso nos lábios, o que lhe valia, por vezes, recompensas avultadas. O mealheiro de Laura começou a crescer. E a recolha de provas para incriminar a quadrilha já era suficiente.
E os anos passaram!
Certo dia, achou por bem deixar o trajecto rotineiro e começou a caminhar livremente, sendo descoberta pelos olheiros que a vigiavam quotidianamente, que saltaram dos esconderijos para a corrigir.
Assustada, Laura desata a correr e a ouvir tiros, que faiscavam na sua direcção. Desvairada e a morrer de medo, atravessa a estrada e é atropelada por um carro. Laura fica em estado de coma durante uma semana. Quando acorda olha para uma desconhecida que lhe diz ser ela a pessoa que a atropelou.
Laura finge-se amnésica. Porém, aos poucos, sentindo-se mais confiante e segura, abriu-se e conta à estranha a sua história, sem saber que estava a falar com uma advogada.
A rede actuava em vários países. Graças à coragem de Laura, aquela organização criminosa foi desmantelada e todos os cabecilhas presos.
Isa Castro

sábado, 1 de março de 2008

Despedimento Compulsivo



O despertador tocou como fazia todas as manhãs. Tânia espreguiçou-se, pensando que tinha mais um dia de trabalho pela frente.Entrou no quarto do filho, dando um beijo e dizendo para se levantar que já estava na hora.Foi para a casa de banho para tomar o duche, logo o filho iria precisar também e por isso teria que se despachar para liberar o lugar. Começou a preparar o pequeno-almoço, e enquanto o tomava ia orientando o filho. De manhã era sempre uma correria. Tânia era secretária, divorciada, e vivia para o filho. Chegou ao emprego pontual.Antes de começar a trabalhar, ela tomava o café e relaxava um pouco para enfrentar o dia que tinha pela frente. Trabalhava na empresa há mais de vinte cinco anos.Fiel e dedicada, acompanhara cada passo da empresa no seu desenvolvimento.Tânia orgulhava-se de ser uma funcionária cumpridora e zelosa.Naquela manhã, ela foi chamada ao gabinete do director, mas o assunto era outro.Ele tinha uma proposta para lhe fazer, mas teria que o escutar com atenção!Depois de o ouvir muito calmamente, respondeu-lhe que estava fora de questão analisar e muito menos aceitar tal proposta.Ele queria dispensá-la arbitrariamente, substituindo-a por mais nova e mais permissiva a certos caprichos hierárquicos!Quando chegou ao seu gabinete, Tânia deu asas ao pranto, chorando, gritando e barafustando convulsivamente.Num ápice, ganhou coragem e pensou que a melhor forma de se recompor era entregar-se de corpo e alma ao seu trabalho, como sempre o fizera.No íntimo, dizia que quanto mais se esforçasse, mais depressa esqueceria a " proposta " do seu director!Entretanto, os dias foram passando e Tânia tinha cada vez menos que fazer.Um dia chega ao gabinete e encontrou apenas uma cadeira para sentar-se.Foi uma explosão de sentimentos em poucos segundos.Sentia-se indefesa! Estava destroçada! Recorreu ao director, mas a proposta feita por ele mantinha-se de pé.Deixou de dormir, ficou apática e abúlica.Não queria acreditar! De um momento para o outro, a sua vida ruíra completamente!Sem dar por ela a depressão tomou conta dela. Impossível trabalhar naquelas condições. O médico obrigou-a a repousar-se em casa e receitou-lhe alguns medicamentos!Quando se sentia melhor ia para a empresa!Lutou três anos contra tudo e contra todos, mas a pressão foi mais forte: venceu-a !Tânia aceitou a proposta e foi-se embora, largando ali uma vida de trabalho e de zelo ! Quantas vezes deixaram de viver para dar prioridade à sua profissão! Num segundo o chefe jogara tudo no lixo, como se de um inútil e desprezível papel amarrotado se tratasse! Casos como o da Tânia infelizmente há-os aos milhões, neste planeta cada vez mais global e menos humano, porque no mundo do trabalho passou a imperar a lei da selva!

Isa Castro